
A empresa norte-americana de engenharia genética Colossal Biosciences chamou atenção do mundo inteiro em 7 de abril, quando anunciou a "desextinção" do lobo-terrível. Nesta quinta-feira (22), a cientista-chefe da companhia afirmou que os animais recriados não são 100% iguais aos que existiam há mais de 10 mil anos.
— Não é possível trazer de volta algo que seja idêntico a uma espécie que já existiu. Nossos animais são lobos-cinzentos com 20 edições genéticas que foram clonados — disse Beth Shapiro ao portal New Science.
A cientista reforçou, ainda, que, desde o início, a empresa deixou claro que as invenções não eram lobos-terríveis verdadeiros. Em comunicado da empresa, publicado em 7 de abril, o processo foi descrito com alguns detalhes que mencionaram a participação dos lobos-cinzentos.
"A Colossal Biosciences, a única empresa de desextinção do mundo, anunciou hoje o renascimento do outrora extinto lobo-terrível — o primeiro animal do mundo a ser desextinto com sucesso", escreveu a companhia, na época.
Marco Antonio Marinho, professor do Departamento de Ecologia, Zoologia e Genética do Instituto de Biologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), acredita que o termo "desextinção" pode ter dado uma ideia errada sobre o experimento:
— Esse termo "desextinção" foi criado nesse contexto aqui e, de fato, seria um termo errôneo, um termo incorreto para o processo. Porque não é possível desextinguir algo.
Não é possível trazer de volta algo que seja idêntico a uma espécie que já existiu.
BETH SHAPIRO
Cientista-chefe da Colossal Biosciences
Ele explica que o processo de formação de uma nova espécie acontece aos poucos, quando grupos vão mudando geneticamente com o tempo. Se forem vantajosas e se o ambiente favorecer, as mutações se espalham entre os indivíduos. Uma nova espécie só surge quando as diferenças ficam tão grandes que os grupos não conseguem mais cruzar entre si.
— Você pode até criar um animal, uma planta que seja, com características de uma espécie que já foi extinta. Isso pode ser feito pela mudança de genes. Então você pode modificar um indivíduo geneticamente para se parecer com o outro, que foi o caso do lobo-cinzento e do lobo-terrível. Mas isso não significa que estão trazendo a espécie de volta. Porque a espécie depende das populações e depende muito do ambiente onde ela está — complementa.
Como funciona a técnica?
A partir de dois fósseis do lobo-terrível, os cientistas sequenciaram o DNA antigo para ter uma ideia de como era o material genético dessa espécie. Com essas informações, realizaram uma edição gênica de células de uma espécie atual — o lobo-cinzento —, que tem parentesco com o lobo-terrível, para deixar as características mais próximas das do animal extinto.
"Ao utilizar edição de ponta baseada em CRISPR, a Colossal ressuscitou uma espécie perdida no tempo, demonstrando o poder da biologia sintética para reverter a extinção", escreveu a empresa. A técnica, pronunciada como "crísper", é como uma tesoura genética programável, que permite que os cientistas cortem, removam ou troquem precisamente partes do DNA.
Opinião da comunidade científica
Em abril deste ano, Marinho defendeu que ainda não era possível chamar os animais de lobos-terríveis porque a Colossal não havia submetido um artigo científico para a revisão de pares. Para o pesquisador, seriam lobos-cinzentos com características de lobo-terrível.
— Dentro da genética, usamos o termo híbrido de uma forma mais estrita para quando duas linhagens se cruzam. Então, por exemplo, o lobo selvagem consegue cruzar com o cão doméstico, e aí geram um híbrido que tem metade do DNA de uma linhagem e a outra metade de uma outra linhagem. Não dá para chamar esse lobo-terrível da nova geração de híbrido — explicou, à época.
Marinho afirmou temer que a possibilidade da "desextinção" desestimule os esforços para a conservação das espécies. Ou seja, por saber que é possível trazer animais de volta à vida, as pessoas deixem de se preocupar em evitar a extinção. Apesar disso, ele acredita que há pontos positivos no feito da Colossal.
— Do ponto de vista técnico, de metodologia de pesquisa, obviamente eles estão fazendo vários avanços. Inclusive, se tudo se comprovar, o número de edições feitas no genoma do lobo-cinzento deve ser o maior número já feito no genoma de uma espécie. O recorde atual de edições era de oito genes, e para a transformação desse lobo-cinzento foram feitas 20 edições — pondera.