
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria e decidiu, nesta quarta-feira (11), que o artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) é inconstitucional, ou seja, os ministros defenderam que as plataformas devem remover postagens antes mesmo de decisão judicial.
A definição ocorreu durante a tarde com o voto do ministro Gilmar Mendes. Na mesma linha, também nesta quarta, votaram os ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin. Antes destes três, já haviam votado pela inconstitucionalidade do artigo os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso. Apenas o ministro André Mendonça abriu divergência.
— Vejo como inconstitucional, portanto, a interpretação de que o artigo 19 do Marco Civil concede uma isenção absoluta de responsabilização para plataformas com alta interferência sobre a circulação de conteúdo. (...) O artigo 19 do Marco Civil da Internet não é mais suficiente — afirmou Gilmar Mendes.
Ao ler seu voto, o magistrado disse que "os algoritmos identificam que conteúdos extremistas, teorias conspiratórias e narrativas polarizadoras geram mais cliques, compartilhamentos e comentários do que informações factuais e debates equilibrados", e complementou:
— Esses conteúdos recebem maior visibilidade e alcance, sendo impulsionados para audiências progressivamente maiores. O resultado é a amplificação sistemática de discursos que fragmentam o tecido social e minam as bases do diálogo democrático. Ademais, a personalização algorítmica fomenta câmaras de eco, apresentando informações que confirmam crenças preexistentes dos usuários. Isso exclui visões divergentes, intensifica a polarização e erode a capacidade de diálogo entre diferentes grupos.
De acordo com as regras atuais, o artigo prevê a responsabilização das empresas pelos conteúdos postados, mas isso só ocorre após a emissão de uma ordem judicial específica, caso não seja cumprida.
Mendes ainda salientou que o artigo 19 do Marco Civil se mostra "ultrapassado":
— Embora o artigo 19 do Marco Civil da Internet tenha sido de inegável importância para a construção de uma internet plural e aberta no país, hoje o dispositivo se mostra, a meu ver, ultrapassado — frisou o magistrado.
Próximos passos
O julgamento teve início em novembro do ano passado, mas foi suspenso após um pedido de vista de Mendonça. A retomada dos votos ocorreu na semana passada.
Apesar da maioria, os termos da responsabilização das plataformas ainda serão definidos pelos ministros. O ministro Luís Roberto Barroso, presidente da Corte, afirmou que os pontos apresentados pelos ministros levarão a um voto de "consenso sobreposto".
Ainda vão votar os ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Kassio Nunes Marques. Contudo, não haverá uma decisão final por enquanto, já que Cármen Lúcia não poderá votar nesta semana, e o ministro Nunes Marques disse que precisa de mais tempo para reflexão.
Nesta quinta-feira (12), votam os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes.
Como votaram os outros ministros até agora:
Apenas o ministro André Mendonça abriu divergência e votou pela manutenção da validade do artigo 19 do Marco Civil. O placar ficou em seis a um pela responsabilização das redes por conteúdos postados por terceiros:
- Dias Toffoli: afirmou ser inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil. Toffoli defendeu que, em casos de conteúdos ofensivos ou ilícitos, as plataformas digitais devem fazer a remoção a partir do momento que forem notificadas de forma extrajudicial, pela vítima ou seu advogado, sem necessidade de ordem judicial.
- Luiz Fux: votou pela inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil, pois o dispositivo daria uma espécie de "imunidade civil" às empresas. Fux propôs que as empresas sejam obrigadas a remover conteúdos ofensivos à honra ou à imagem e à privacidade que caracterizem crimes (injúria, calúnia e difamação) assim que notificadas, e o material só poderia ser republicado, posteriormente, com autorização judicial.
- Luís Roberto Barroso: votou pela inconstitucionalidade parcial do artigo 19. Para ele, as redes devem retirar postagens com conteúdo envolvendo pornografia infantil, suicídio, tráfico de pessoas, terrorismo e ataques à democracia e ao Estado Democrático de Direito. Pela deliberação de Barroso, a retirada deve ser tomada após as empresas serem notificadas pelos envolvidos.
- André Mendonça (divergente): abriu divergência e votou pela manutenção da validade do artigo 19 do Marco Civil, que prevê a responsabilização das plataformas somente em caso de descumprimento de decisões judiciais. Mendonça destacou que as plataformas digitais têm legitimidade para pleitear, em nome próprio, a tutela jurisdicional necessária e a preservação da livre manifestação dos seus usuários.
- Flávio Dino: votou a favor da responsabilização das redes sociais por conteúdos postados por usuários. Dino adotou uma posição de mediação entre os entendimentos já apresentados pelos colegas, retomando argumentos anteriores e reforçou que, segundo a Constituição, há limites a liberdade de expressão. O ministro disse que "a liberdade de expressão é um direito fundamental, mas não é absoluto".
- Cristiano Zanin: votou a favor da responsabilização das redes sociais por conteúdos postados por usuários. Com Dino e Barroso, Zanin se alinhou à corrente intermediária no julgamento. Segundo ele, é preciso "aproximar a responsabilidade das plataformas com a responsabilidade que nós fixamos para os veículos de comunicação tradicional".