
A proposta do governo federal para amenizar o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) não agradou entidades setoriais e parte do mercado financeiro. Após reunião com integrantes do Congresso, no domingo (8), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, adiantou que a alternativa passa por recalibrar a cobrança do IOF, diminuindo a carga sobre alguns setores, e uma reposição de perdas, que passa pela taxação de outros segmentos, como títulos e empresas de apostas esportivas.
Especialistas avaliam que o projeto não é estrutural e mantém cenário de aumento de impostos. Até o momento, o governo não bateu o martelo sobre os projetos e não detalhou as medidas.
Doutor em direito tributário, Rafael Pandolfo, sócio-fundador do escritório que leva seu nome, afirma que o fato de o governo apenas mitigar a alta do IOF não afasta o risco de judicialização, porque o tributo continua sendo usado de maneira inadequada.
Além disso, o governo amplia o leque de resistência ao flertar com o corte de isenções fiscais concedidas a alguns setores, tributação de títulos, como LCI e LCA, e aumento de imposto para bets. Caso as medidas ventiladas pelo ministro avancem, o cenário pode ser de trava na economia, segundo Pandolfo:
— Vão atingir o caixa de empresas. Começando pela questão das compensações. As grandes empresas compensam valores tributários mensalmente e, certamente, vão ser atingidas. E tributação do risco sacado mesmo, que tem reduzida, segue atingindo as empresas.
Segundo Pandolfo, a necessidade de ajuste de caixa está fazendo com que o governo acabe aprovando medidas que vão contra ramos que ele sempre defendeu, como o habitacional, e o crescimento econômico.
Desestimulo
O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, lembra que, em um cenário com o setor imobiliário enfrentando problemas de funding, as LCIs têm sido um importante mecanismo de captação de recursos para o setor. Com isso, a tributação de títulos, como LCA e LCI, tem potencial de prejudicar setores importantes.
— Já temos um custo elevado de financiamento por conta dos juros altos. Se taxar as LCIs, vai aumentar ainda mais. No caso das LCAs, a situação é um pouco ainda mais grave. Nas últimas duas safras, de 2024 e de 2025, as LCAs têm sido utilizadas como um importante mecanismo de captação de recursos e financiamento das atividades do agronegócio — avalia o economista.
Agostini destaca o fato de o governo, mais uma vez, não colocar para discussão uma saída concreta e definitiva, optando por alternativas paliativas, que afastam a possibilidade de melhoras no futuro.
Falta de mudança estrutural
Guilherme Almeida, head de Renda Fixa da Suno Research, afirma que, no geral, o mercado recebeu de forma "bastante negativa" as alternativas apontadas pelo ministro da Fazenda. Isso porque existia uma expectativa de que fossem discutidas questões estruturais, segundo o especialista.
No entanto, o governo ventilou, até o momento, medidas pontuais via aumento de carga tributária, não comentando ações para eficiência do gasto público e no âmbito da sustentabilidade da dívida no longo prazo.
— De forma geral, a avaliação é negativa justamente porque, no fim do dia, o contribuinte terá mais imposto a pagar e, quando a gente olha o impacto disso, ele é extremamente relevante. LCIs e LCAs, por exemplo, são importantes fontes de captação de recursos para esses respectivos setores. E é bem possível que a tributação também em CRIs e CRAs e debêntures incentivadas vem desestimulando o investimento para o longo prazo, principalmente nesses setores que carecem de investimentos para crescerem, para se desenvolverem — destaca Almeida.
Em nota, a Federação das Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul) classificou como "lamentáveis" as medidas anunciadas por Haddad. Além de citar a possibilidade de taxação de LCAs e LCIs, a entidade também afirma que o possível aumento da tributação das fintechs parece ser um erro, pois desestimula um ramo que ampliou a digitalização do sistema financeiro e ofereceu "concorrência aos grandes bancos, democratizando o crédito e pressionando os custos bancários para baixo".
"Nada foi anunciado de cortes do Governo 'na sua própria carne', nem nas estatais, ou mesmo nas emendas parlamentares, de onde poderia vir um alívio grande nas despesas, tornando desnecessária a solução surrada da elevação da carga tributária", destaca trecho do comunicado da entidade.