
Quem passou os últimos 28 anos pagando o pedágio mais caro do Brasil nas BRs 116 Sul e 392 é tentado a soltar foguetes quando lê a reportagem do jornalista Jocimar Farina, informando que essas rodovias essenciais para o escoamento da produção gaúcha voltarão a ser de responsabilidade do Dnit a partir de 2026. O fim do pedágio parece uma boa notícia, mas não é. Os gaúchos já viram esse filme no governo de Tarso Genro, quando as rodovias federais pedagiadas foram devolvidas ao governo federal, e não houve final feliz.
Quem não tem memória curta há de lembrar a síntese do enredo. Os polos de pedágio eram formados por rodovias estaduais e federais repassadas ao governo do Estado para que fizesse as primeiras concessões. Como o prazo era curto (15 anos), a tarifa ficou muito elevada.
Sem precedentes e feitas em um período imediatamente posterior ao Plano Real, o contrato previu uma taxa interna de retorno muito elevada, sem obras de vulto. A então governadora Yeda Crusius se dispôs a prorrogar o prazo e incluir novas obrigações aos consórcio, mas não conseguiu apoio político.
O governo Tarso Genro poderia ter feito um novo edital, corrigindo os efeitos da concessão anterior, mas preferiu devolver as BRs ao governo federal, entre elas a 386 e a 290, e criou a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) para continuar mantendo e cobrando pedágio nas estaduais. Péssima ideia.
Sob responsabilidade do Dnit, as rodovias federais desandaram. Até hoje, a BR-290 não foi duplicada e sua conservação, de Eldorado do Sul a Uruguaiana, é desastrosa. Paga-se o pior de todos os pedágios: em vidas nos acidentes de trânsito, sem contar pneus furados, rodas quebradas e chassis avariados.
Concedida à CCR Via Sul no pacote que incluiu a BR-101 e a freeway, a 386 está enfim sendo duplicada. Não com a velocidade desejada, mas com um cronograma que permite aos usuários ter esperança de, finalmente, ir de Porto Alegre a Carazinho por uma rodovia segura e bem-conservada.
A BR-392 foi duplicada pelo governo federal, mas até hoje a ponte do Canal de São Gonçalo, entre Rio Grande e Pelotas, segue em pista simples. A BR-116 também está sendo duplicada pelo poder público, sem que a Ecosul (hoje Ecovias) tenha feito uma só obra de grande porte. Não fez porque nunca esteve no contrato, que já foi prorrogado. Discutiu-se uma nova prorrogação, agora incluindo obras e redução do valor do pedágio, mas era uma proposta indecente depois de tantos anos de exploração.
Qual seria o caminho ideal? Preparar um novo edital, no início do governo Lula 3, fazer o leilão e deixar tudo pronto para o vencedor assumir no dia seguinte ao término do atual contrato. Mas pedágio é impopular e o governo não fez o óbvio. No ano eleitoral de 2026, as BRs 116 e 392 serão mantidas pelo Dnit. Quem acha que essa é uma boa ideia pode dar um passeio pelas BRs 290 e 158, para citar dois exemplos, e avaliar se é isso o que se quer para, no mínimo, os próximos três anos.